"Algo estranho acontece todo final de ano: as pessoas ficam simpáticas. Do nada. Corrigindo: as pessoas que não tinham o hábito de praticar gestos gentis se veem automaticamente entupidas de uma bondade jamais vista. Com direito a brilho nos olhos, sorriso de orelha a orelha e braços mais abertos que os do Cristo. Desde 1984, quando nasci, sou testemunha viva desse fenômeno. Não costuma durar muito tempo – geralmente chega na segunda quinzena de dezembro e se estica até o primeiro amanhecer de janeiro.
A sensação que eu tenho é que todo mundo se matriculou ao mesmo tempo em aulas de ioga. Intensivão de pensamentos positivos ohmmmmmm; supletivo de postura bacanuda perante o amor ao próximo ohmmmmmm; hora extra pelo futuro da Mãe Natureza ohmmmmmm… Seria lindo se não fosse perecível.
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Mas cuidado, praticante do bem diário: essas pessoas tocadas pela bondade repentina podem voltar ao normal a qualquer momento. Num mundo onde a concorrência é cada vez mais maldosa, ser bom, infelizmente, virou um diferencial. Isso sempre me incomodou. Não gostaria que a gentileza fosse um item de supermercado, posicionado estrategicamente na prateleira mais alta, com código de barras e prazo de validade – uma espécie de panetone a ser consumido imediatamente.
Que em 2015 todo mês seja dezembro."